Os Bem-te-vis


 Levando minha filha ao colégio logo pela manhã bem cedo, passei por uma discussão acirrada. Feroz. Dois Bem-te-vis discutiam em cima de um poste a respeito do uso ou não de um determinado advérbio.

A discussão se dava da seguinte forma:

- Te vi - chilreava o primeiro, dizendo que seria melhor assim, mas sucinto e claro, não restando dúvida de qual animal se tratava esse canto. Não sendo assim necessário usar um advérbio para explicar o que já era autoexplicativo.

O segundo não se fez de rogado e chilreou mais alto que o primeiro:

- Bem-te-vi - explicando que não era um exagero usar um advérbio em algo, sendo que esse algo ficaria muito melhor aos ouvidos de seus ouvintes.

O primeiro repetiu seu canto, solicitando ao segundo que prestasse bastante atenção:

- Te vi - chilreou dizendo: ouviu e viu como é óbvio o óbvio, meu amigo? Basta o pronome e o verbo para saber de quem se trata. Para que um BEM antes? Besteira, a meu ver.

O segundo já impaciente balançou a cabeça, tentando afastar a burrice do primeiro.

- BEM-TE-VI - olha que coisa sonora. Que delícia de som. Vai até mais longe. Consegue entender onde quero chegar, nobre amigo? Não é a quantidade, e sim a qualidade...

Claro que o outro nem lhe deu ouvidos, e repetiu seu canto.

- Te-vi.

- Bem-te-vi.

- Te-vi.

- Bem.

- Te-vi.

- Bem.

- Te-vi.

A discussão continuou após minha passagem com destino ao colégio de minha filha.

Porém, infelizmente, não puder saber seu desfecho, pois na volta eles não estavam mais lá. Tinham levado sua discussão para outro posto. Para outros ouvidos.

Uma pena.

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